quarta-feira, 14 de outubro de 2009

CNJ discute conflitos fundiários, sem participação dos movimentos sociais

O Conselho Nacional de Justiça realizou de 29/09 a 01/10, em Campo Grande (MS), o I Encontro do Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos Conflitos Fundiários Rurais e Urbanos. Mesmo sem convidar os movimentos sociais, o encontrou tentou aprofundar o debate sobre a atuação do Poder Judiciário na questão fundiária brasileira com um público formado por juízes, desembargadores, representantes dos ministérios públicos, advogados, defensores públicos, agentes do Estado e representantes dos ruralistas.

É relevante considerar que o Poder Judiciário tem um importante papel para a questão fundiária, já que também é responsável pela efetivação dos direitos humanos e de políticas públicas, entre elas a de Reforma Agrária. Por esse motivo o espaço do Fórum se caracteriza pela intensa disputa política, uma vez que ele poderá pautar a atuação do Poder Judiciário no tema.

Durante a abertura do evento, um dos temas levantados foi o conflito entre direito à propriedade e direitos sociais. Para o Presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Elpídio Martins, o “Judiciário não pode ignorar o confronto entre direitos sociais (acesso à terra para povos e comunidades tradicionais, reforma agrária e urbana) e o direito de propriedade”, dando a entender que a propriedade privada individual e absoluta deveria prevalecer. Ressaltou ainda que em Mato Grosso do Sul demarcações de terras indígenas estão ocorrendo em áreas “muito produtivas” e que o direito de propriedade precisa ser respeitado em detrimento do direito de preservação da cultura indígena.

O presidente do CNJ e do STF, Gilmar Mendes, aproveitou para condenar a ocupação de terras pelo MST, considerando inaceitável a “invasão de terras” e a posterior desapropriação do imóvel. Contraditoriamente, disse que vivemos no Brasil uma barbárie e que o Fórum deve “ajudar a encontrar o caminho da civilização”. Mendes ainda conclamou a todos os presentes para buscar uma solução para os conflitos fundiários. Para ele os processos criminais deveriam ter prioridade máxima, o que traria resultados na diminuição dos conflitos.

Mas, se as falas iniciais apontaram para a defesa do direito de propriedade, em contraposição aos direitos sociais, as propostas discutidas pelos grupos de trabalho indicaram outro caminho. Enquanto Gilmar Mendes, Elpídio Martins e o Governador do Estado, André Puccinelli, defenderam o direito de propriedade individual e absoluta e atacam direitos dos indígenas, os juízes, desembargadores, promotores, defensores públicos, advogados, entre outros, souberam dar relevo à necessidade de garantir a democratização do acesso à terra na aprovação das propostas que serão levadas ao pleno do CNJ.

Na mesma linha enquanto Gilmar Mendes defendia prioridade para os processos criminais, o Desembargador do TJRS, Amilton Bueno de Carvalho,debatendo a crise da lei e o princípio da proporcionalidade, apontou que a “criminalização dos movimentos sociais é uma imbecilidade”, e que não há espaço para o direito penal resolver conflitos sociais, muito menos os complexos conflitos que envolvem a questão fundiária.

É importante refletir que caso o CNJ enfoque sua atuação em processos criminais, estará concorrendo para aumentar a criminalização dos movimentos sociais e não contribuirá para a efetivação das políticas públicas de democratização e de acesso à terra. Todas as propostas discutidas durante o Encontro serão levadas ao CNJ para a posterior incorporação no planejamento do Conselho e na pauta política do Judiciário.
Meta do CNJ irá mascarar a origem dos conflitos fundiários?

Durante o I Encontro do Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução de Conflitos Fundiários Rurais e Urbanos, organizado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ – puderam ser discutidas e apresentadas propostas para resolução dos conflitos fundiários no Brasil. Uma delas é a meta de identificar e reduzir em, no mínimo, 10% ao ano os conflitos fundiários rurais e urbanos no país, incluindo os relacionados ao trabalho escravo. Mas, cabe ressaltar que a meta de redução de conflitos só pode ocorrer se estiver absolutamente atrelada à democratização do acesso à terra no país.

O Brasil é o segundo país do mundo em concentração fundiária – atrás apenas do Paraguai, onde há forte atuação do agronegócio brasileiro – e também um dos maiores do mundo em concentração de renda. Os conflitos no campo são conseqüência da inaceitável desigualdade no acesso à terra. Realizar as reformas agrária e urbana, titular territórios quilombolas, demarcar terras indígenas e garantir acesso à terra para os demais povos tradicionais é o único caminho aceitável e eficaz para reduzir os conflitos fundiários. Reduzir conflitos sem garantir a democratização do acesso à terra será um engodo e encobrirá problemas sociais que mais tarde aparecerão com maior gravidade.

Entre as propostas aprovadas nos grupos de trabalho estão a recomendação de criar uma súmula vinculante, no STF, que dê prioridade na tramitação de ações de desapropriação de terra para a reforma agrária, para o devido cumprimento da Lei Complementar n° 76/93 . Também foi aprovada uma proposta para criação de uma Justiça Agrária, que não tem uma concepção penal, mas sim de garantia do direito à terra, moradia e alimentação, através dos processos judiciais, administrativos e, principalmente, através de políticas públicas, à semelhança do que ocorre na justiça do trabalho. Também foi aprovada proposta para que o CNJ recomende a atualização dos índices de produtividade, como forma de viabilizar um dos aspectos relacionados com o cumprimento da função social da propriedade.

Convalidando propostas do primeiro seminário fundiário do CNJ, realizado em maio deste ano, foi apontada a necessidade de averiguar o cumprimento da função social da propriedade em ações de possessórias derivadas de conflitos coletivos da posse da terra.

Todas as propostas aprovadas no encontro serão levadas ao pleno do CNJ, para discussão e aprovação. Sabendo que o Poder Judiciário é um dos espaços de disputa por afirmação de direitos humanos caberá às organizações monitorar o andamento que o CNJ dará às propostas aprovadas.

Leia as propostas aprovadas nos grupos de trabalho realizados durante o I Encontro do Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos Conflitos Fundiários Rurais e Urbanos

Propostas aprovadas no Grupo de Trabalho Agrário

http://www.cnj.jus.br/images/1_-_workshop_agrrio.pdf

Propostas aprovadas no Grupo de Trabalho Urbano

http://www.cnj.jus.br/images/2_-_workshop_urbano.pdf

Propostas aprovadas no Grupo de Trabalho sobre Trabalho Escravo

http://www.cnj.jus.br/images/3_-_workshop_trabalho_escravo.pdf

Propostas aprovadas no Grupo de Trabalho Regularização Fundiária

http://www.cnj.jus.br/images/4_-_workshop_regularizao_fundiria.pdf

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