domingo, 7 de junho de 2009

CONSELHOS AOS CALOUROS DE DIREITO

CONSELHOS AOS CALOUROS DE DIREITO

Ronaldo Rebello de Britto Poletti

De vez em quando leciono Introdução ao Direito na UnB. Como de praxe, a primeira aula versa sobre generalidades. Após cumprimentar os alunos pelo ingresso na Universidade, proclamo errados os versos tradicionais com que os veteranos os saúdam:

Nem tudo que reluz é ouro
Nem todo sopapo é murro
Nem todo burro é calouro
Mas todo calouro é burro.

Ao contrário, os calouros são inteligentíssimos. Não estão, ainda, contaminados com certas leituras jurídicas e muito menos com os processos judiciais. Além disso, vivem o sonho na plenitude. Daí os meus conselhos aos neófitos.
Lembro-lhes que a Universidade é pública, porém não gratuita, pois o povo brasileiro é quem paga o curso. Impõe-se-lhes, portanto, uma grave responsabilidade em face do Brasil.

O homem é um ser racional e livre. Não intento que os alunos pensem como penso, tenham as minhas idéias, nem com elas sejam alinhados. Não devem ser escravos do último livro ou do último professor. Muito menos dos modismos intelectuais e políticos. Cuidado com os sedutores, que pretendem conquistar as consciências com as “vulgatas” de doutrinas dogmáticas! Exijo, apenas, que eles pensem livremente, mesmo de forma equivocada.

A política é sempre um mal na Universidade. Pode justificar-se em um regime de opressão, onde não houver espaço para a prática da política. Em um regime livre, a política deve ser feita fora da Universidade, nos partidos, para não contaminar as finalidades acadêmicas. A Universidade não deve estar a serviço de ninguém, a não ser de si própria, vale dizer a serviço da Cultura, a qual nela se preserva e se renova. Essa, aliás, é a única forma eficaz de servir à sociedade.
Res severa magnum gaudium (na severidade a maior das alegrias). É uma frase latina, que colhi inscrita acima dos tubos de um órgão monumental em uma sala de concertos na antiga Alemanha oriental. A mocidade precisa amoldar-se a uma forte disciplina. Sem ela, raros serão os verdadeiros frutos. São inúmeros os exemplos dos talentos que não lograram êxito porque não perseveraram no estudo sério.

Os estudantes de direito devem o quanto antes, sem prejuízo de retificarem o rumo, atender logo a sua vocação profissional: advocacia, judicatura, ministério público, polícia judiciária, consultoria e etc. Vocação, não emprego, salário, acomodação ou sinecura. Precisamos acolher o ensinamento dos antigos: Nullus suus ventus ignoranti quem petat portuum (Nenhum vento nos é favorável se ignoramos o porto para onde vamos).

Quando se formarem, sobretudo ao exercerem uma profissão jurídica, terão poder nas mãos. Saibam como usá-lo. Severitas in re suaviter in modo (duro na substância, suave no modo).
Os estudantes de Direito têm, ainda, uma grave responsabilidade no campo da linguagem. Um dos deveres do advogado é expressar-se, corretamente, na língua portuguesa. O Direito tem uma linguagem técnica, porém não esotérica, por isso deve ser clara e precisa. Os juristas devem fugir da gíria forense, dos cacoetes dos rábulas burocratas, não raro presente nos balcões dos cartórios e até nas mesas dos juízes.

Nem tudo, todavia, é dureza. É necessário, sobretudo, a manutenção do sonho e não fazer do estudo uma tortura ou um martírio. Os jovens precisam viver e aproveitar, embora de forma moderada, o dia de hoje (carpe diem) e colocar, pelo menos nessa fase da existência, a vida antes da filosofia: primum vivere deinde philosophari.


Fonte: http://www.fd.unb.br/images/calouros_de_direito.pdf

2 comentários:

  1. O texto é bem legal. Só acrescentaria um detalhe ao "O homem é um ser racional e livre", pois ele também é sentimento. Sem isso, poderiam ser cometidas atrocidades em nome da racionalidade pura. E discordo de um ponto "Em um regime livre, a política deve ser feita fora da Universidade, nos partidos, para não contaminar as finalidades acadêmicas." A Política deve estar presente em todos os ambientes, não a partidária, mas a que decide a vida em sociedade, inclusive a vida acadêmica, afinal ela não é um dado natural nem uma questão meramente técnica, mas eminentemente política.
    Marquinhos

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  2. o texto é legal??? o texto é extremamente liberal, apolítico e - o pior - pretende ser "formativo"... pensei no começo que ele era diferente, mas no meio parece que o cara se perdeu e foi falar o senso comum (cheio de bom latim, óbvio, como é do feitio de qualquer professor nefelibata, como diria Lyra Filho).

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