domingo, 12 de setembro de 2010

No crime de tráfico, o STF escreve certo por linhas tortas

STF e tráfico: certo ainda que com nem todos os argumentos corretos

Alexandre Morais da Rosa, Juiz de Direito (SC)

A discussão sobre a possibilidade de aplicação de benefícios (substituição ou suspensão da pena) decorre da individualização da pena. Este fundamento do STF está correto, embora não enfrente a questão principal. A Nova Lei fez o que é certo: o usuário não é preso e recebe sanções diferenciadas. Aliás, para mim - e decido como tal - o uso de droga, cigarro, bebida, comida gordurosa, é Direito Fundamental. O Estado não pode proibir o sujeito de consumir o que lhe faz mal. Mas esta é outra questão.
O discurso padrão é ingênuo e decorre de uma sucessão de ilusões:
1) Guerra do tráfico: o inimigo externo comunista (construção ideológica) foi substituído pelo Traficante;
2) Arregimenta-se uma ilusão midiática de que todos os males do mundo possuem um responsável: traficante;
3) Manipula-se o senso comum no sentido de que a repressão ao tráfico resolverá a situação de caos social;
4) Prendem-se basicamente os que correm os riscos e são substituídos no momento seguinte por outros kamikazes que, juntamente com os transportadores, acabam sendo presos como traficantes, sem contar os usuários que revendem para manter o vício.
Resultado:
1) quem comanda o tráfico raramente é preso;
2) As prisões estão lotadas de usuários em que a polícia "força" um tráfico porque acha que a sanção do usuário é pequena;
3) Os operários do tráfico, os Kamikazes, são guindados imaginariamente à condição de Traficantes.
Com este quadro, de um lado, apazigua-se o senso comum, fingindo-se combater o tráfico, enquanto, por outro, a classe política ocupa o espaço de debate com o que poderia ser mais importante à comunidade, o sistema de Controle Social (Polícias e Judiciário) mantém suas atividades, as Penitenciárias Privadas lucram (e muito, talvez a maior fraude neoliberal, pois o sistema cria demanda e todos lucram), e o tráfico continua. A única saída, mesmo, é legalizar tudo! Mas aí os corruptos de todas as searas perderiam suas fontes de renda, os políticos teriam que levar em conta coisas mais sérias, a imprensa perderia os "pops" do crime, os falsos moralistas perderiam o palanque, além de usar o direito penal para o que é importante democraticamente. O STF está certo, ainda que com nem todos os fundamentos corretos.
Este texto foi copiado do blog do autor http://alexandremoraisdarosa.blogspot.com/ e colado aqui.

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